sábado, 12 de junho de 2010

Sem título.

O novo som veio detrás dela. O ruído era ensurdecedor e vigoroso como o rugir de um leão. Rita (1) não só o ouviu, mas também o sentiu. Uma luz branca e intensa penetrava as suas retinas enquanto o seu pequeno mas forte coração pulsava rapidamente. Conseguia escutar belos cânticos, bem como, as vozes de alguns anjos que lhe sussurravam palavras aconchegantes, semelhantes ao calor provocado pelas chamas de Inverno que flamejam furiosamente nas lareiras. Sentia-se leve, podia flutuar. Contudo, outras vozes chorosas lastimavam-se e pediam-lhe que voltasse. Porque quereriam elas que Rita saísse do paraíso? Aqueles últimos ruídos tornaram-se tão incomodativos que a rapariga decidiu regressar. Foi então que ouviu o seu pai:

- Rita, minha querida filhinha…Sê forte! - dizia o seu pai que a abraçava com ternura.

Pestanejou, e, pouco a pouco, a imagem tornava-se mais nítida, até que conseguiu ver a sua mãe, devastada, andando às voltas sem saber o que fazer. Era horrível! Entretanto, um feixe de luzes vermelhas e intermitentes ofuscou a sua, ainda delicada, visão. Colocaram-na numa superfície dura, muito pouco confortável, tal como a realidade que enfrentava. Lentamente, fechou os olhos, adormecendo sem que desse conta para onde a levavam.

Os dias foram passando dentro de paredes de sofrimento que, ao mesmo tempo, eram local de curativo. Rita achava triste o facto de todos os dias ter de presenciar ao tormento dos outros. Um sítio que «sara as pessoas fisicamente, mas não psicologicamente» dizia. As senhoras que vestiam batas azuis eram impetuosas ao efectuar os tratamentos. Também, a dor impedia as pessoas de lá de fazerem fosse o que fosse.

Em todos os momentos, Rita usufruiu de grandes ombros amigos e a sua maior felicidade tornou-se assistir ao sorriso de uma criança.

Ela não sentia a sua própria dor. Na verdade, não lhe doía nada, comparado com a mágoa que perseguia, persistentemente, as pessoas mais chegadas. Além disso, ficava aborrecida por terem pena dela. Era o pior de toda a situação. Por essa razão, Rita resolveu domar o seu espírito maltratado e o seu corpo preguiçoso, ultrapassando todas as suas dificuldades.

(1) Rita: Diminutivo de Margaret, ou do italiano Margherita (Margarida). Faz alusão a determinadas atitudes relacionadas com a tenacidade e com a força de vontade. É próprio de pessoas que se sacrificam ao extremo quando estão convictas de que há uma razão para isto.